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A Cidade a Seis Pés

Atualizado: há 3 dias



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TERMO DE ABERTURA do livro CANTOS CORRENTES


CuraTela da Inexposição Madame Pochette


Sinopse A protonauta Agnes Dellacroix consente participar de uma transferência de alta volatilidade, quanto à compatibilidade entre a configuração espectral do ser e a configuração perceptual da sede condicionante.


Submetida a uma confecção experimental de energiaria táxtil de grande incerteza, ela não conta com recursos apropriados, plurais e diversificados, para enfrentar as eventuais imposições sensoriais às quais estará sujeita. O único instrumento garantidor com dose razoável de confiabilidade é a possibilidade de um imaginário diálogo com uma espécie de alter ego, ou um contraponto de alteridade, representado por um cantor, Paulinho da Vila.


O objetivo da transferência é aprofundar os estudos sobre concepções, intensamente debatidas pelos kyneaztaz e kryptykoz, a respeito de um suposto e possível estatuto fenomenológico do inexversus, e que os arquitextores decidem testar com o uso de recentes aprimoramentos na tecnologia de transferência de vultos (seres espectrais).


ATA DE LANÇAMENTO


Pareceres, previsões, orientações dos arquitextores, em mesa redonda no gabinete da Coxia, em Cine Inex.



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Tema 01 - ERA UMA VEZ


Tema 02 - DE OLHO NA TELA


Tema 03 - A NOITE AMERICANA


Tema 04 - PERSONA


Tema 05 - LIMITES


Tema 06 - NA TRILHA DA MÚSICA


Tema 07 - CAFÉ SOCIETY


Tema 08 - LINHA DE MONTAGEM


Tema 09 - ASSINATURAS


Tema 10 - THAT´S ENTERTAINMENT!


Tema 11 - THE TALK OF THE TOWN


Tema 12 - ESCOLA DE CINEMA






ANTES DO LANÇAMENTO





INTRÓITO



A sete palmos acima do nível do mar, está esta cidade a seus pés. Que habita a seis pés de altitude. E transita qual outros seres que tais por outras sedes virtuais.


Existem cidades naturais e cidades planejadas. E existem as transurbes. Existem?


- Quantas cidades tem uma cidade?


Cidade, morada das casas.

Casa, morada de vidas.

Vida, morada de desejos.

Desejo, morada de ausentes.








SEIS PÉS, SETE PALMOS, OITO EM FORMA DE INFINITO



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Ficava no alto de uma pequena elevação. Era uma casa velha, um rústico sobrado, jeito de casebre, parecendo cair aos pedaços. E o caminho para chegar até lá, quase que intransitável. Uma estreita passagem calçada, cheia de falhas, esburacada aqui e ali, com o mato avançando pelas beiradas.


Fazia muito tempo que não era mais indicada pelo endereço. Como foi erguida no cimo de uma plataforma rochosa, ficou conhecida como a casa da laje. Ou do lajedo, outro nome que se deu à plataforma.


Não se sabe quem mora ali. Ou se ali mora alguém. Instarou-se nas redondezas um certo temor. Não se sabe de ninguém que tenha ido lá em cima. Nem se sabe o que há do outro lado.


O que haveria do outro lado? Um lago? Seria a casa do lago? Um cenário rupestre como a plataforma? Uma paisagem campestre? Ou um horizonte deserto a se perder de vista?



Alguém que, talvez por curiosidade, pensasse em apreciar a paisagem, como se estivesse num mirante. Haveria do outro lado um lago?Seria a casa do lago? Ou apenas um horizonte deserto a se perder de vista? Ou estaria a casa a seis pés acima do nível do mar? Ou a sete palmos de mãos em um moto perpétuo na curva fechada do infinito.





Antes de esboçar uma resposta, Audite fitou demoradamente o Alfaiate. Fixamente o fitou, ficou assim por longo tempo, não saberia dizer quanto. A demora parecia não encontrar qualquer sinal de impaciência na face do interlocutor. Aproveitou a pequena condição de vantagem tática para elaborar, não uma resposta, que sequer imaginava qual seria, mas uma pergunta provocadora em devolução. O máximo que conseguiu foi uma imagem técnica:

- Conurbações?

O Alfaiate não hesitou: - Talvez, mas me parece inapropriado. Não estou falando de urbes vizinhas que acabam se ligando pela extensão de suas periferias. Estou indagando se uma cidade pode conter outras cidades. Não é uma ideia de limites que se tocam, mas de espaços dentro de espaços.

Seguiu-se longo momento de pausa, em que Audite procurou rever sua tática de oferecer pergunta no lugar de resposta. Decidiu prosseguir com a mesma estratégia, desenvolvendo a imagem sugerida pelo Alfaiate.

- Ou talvez de limites em outra direção. Ou dimensão.

- Sim?, pontuou o Alfaiate em sinal de curiosidade, uma espécie de aval à continuidade do raciocínio.

- Ao invés de junções horizontais, em que uma cidade pode fazer fronteira com muitas outras cidades, não podemos pensar em limites verticais, para cima e para baixo, também com várias cidades em patamar interiores e superiores?

Não saberia dizer como formulou a pergunta, mas ficou satisfeita em conseguir manter a tática do questionamento num nível mais incisivo de contestação.- Não obstante, perguntou-me sobre o que seria essa comunidade... como chama?


- Costa Mater.


- Ah, sim, não lembrava o nome. Essa comunidade da qual a senhora parece crer que faço parte. Pelo menos, é o que suas discretas insinuações me levam a suspeitar.


- E não é?, disparou Audite, aproveitando o ligeiro desvio de foco do Alfaiate. Virando o jogo, lançou a pergunta à queima-roupa.


O Alfaiate colocou as duas mãos sobre o balcão, e lançou de volta um olhar desafiador, fixando bem lá no fundo dos olhos de Audite.


- Vou lhe responder com a mesma sinceridade com que venho conversando consigo já há alguns dias. Ou semanas. E, desculpe-me pela expressão, estou me lixando para questões à queima-roupa. Estou me especializando na confecção de tecidos à prova de fogo, completou em tom jocoso.


Após a ligeira reprimenda, e balançando a cabeça em gesto negativo, o Alfaiate foi categórico:


- Não, não faço parte de tal comunidade, embora já tenha ouvido falar a respeito.


- Mas sabe onde fica?. Assim, de súbito, Audite abandonou a linha de raciocínio que vinha adotando, para aproveitar o momento e obter uma informação mais prática, mais precisa.


- Não, não sei. Ou pelo menos nunca vi. Pois, na verdade, já ouvi falarem de sua localização. Mas nunca fui lá. Nem sei bem onde fica...


- E lembra do que lhe disseram? Tem um endereço?


- O que me lembro de ter ouvido é que essa comunidade não tem localização fixa. Ou única. Mas guardei que fica perto da Laje.

 
 
 

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